INSTINTO, EXPERIÊNCIA E RAZÃO
Observei nas coberturas de risco que, ao lidar com o medo, tenho três ferramentas: o instinto, a experiência e a razão. O instinto é útil nas situações de emergência. Nelas, ele me diz quando é hora de fugir ou de ficar. Mas elas são a exceção, não a regra. Mesmo numa guerra.
Na maioria das vezes, sinto medo, mas não reajo instintivamente a ele, porque tenho tempo de pensar — e muitas outras coisas para considerar. Aí entram a experiência e a razão. A experiência é uma referência, um repertório. Mas ela mesma me ensina que não existem duas situações idênticas. Nem eu sou o mesmo. O mundo e eu estamos em constante mudança. Meus desejos mudam junto comigo. Meus objetivos também mudam, para se ajustar à nova realidade. Afinal, o objetivo é o resultado de uma negociação entre meus desejos e sonhos, de um lado, e a realidade e as demais pessoas, de outro. Sem contato com a realidade e sem ouvir as outras pessoas, o desejo e o sonho degeneram em fantasia. Portanto, não dá certo tentar repetir uma experiência porque ela foi boa. Desconfio das minhas certezas tanto quanto dos meus hábitos. Em geral, eles são armadilhas que me afastam do real — defesas, reações ao medo. Reações impulsivas me atrapalham. Respostas ponderadas me ajudam.
A decisão final, sobre ficar ou sair, continuar ou desistir, é da razão. Ela ouve o instinto, consulta a experiência, analisa a realidade e decide, com base nos meus objetivos. A autopreservação — não ser morto, ferido, preso nem assaltado — não é um objetivo, mas um meio, uma condição.
Procuro conciliar meus objetivos com minha preservação. Não faço coberturas arriscadas por causa do risco, mas apesar dele. O risco é o preço. O fato de serem arriscadas não me impede de fazê-las, mas não corro riscos que eu considere desnecessários. É uma grande negociação.
Só a razão é capaz de me dizer se o que eu alcancei justifica todo o risco que eu corri para chegar até ali. Desistir antes de alcançar o objetivo pode tornar todo o risco corrido fútil. Insistir e enfrentar uma ameaça iminente também pode ser contraproducente: posso perder tudo.
(Extraído do livro “Minha guerra contra o medo: o que o risco de morte revela sobre a vida”, em breve nas livrarias)